segunda-feira, 22 de maio de 2017

Análise Técnica: estudos e divergências quanto ao uso

Livre tradução de parte do texto “Technical Analysis: Modern Perspectives
Por Gordon Scott, CMT; Michael Carr, CMT; Mark Cremonie, CMT, CFA

Nos últimos anos, a MTA (Market Technicians Association) reconheceu a mudança decorrente da mineração de dados (data mining) e adicionou leituras sobre estatística e análise quantitativa no seu programa de diplomação em – analista – técnico de mercado (CMT – Chartered Market Technician). A FINRA (Financial Industry Regulatory Authority) deu seu reconhecimento oficial a certificação CMT como uma designação profissional de finanças em 2005. Mas aparentemente foi a comunidade acadêmica a primeira* a reconhecer essa mudança para uma abordagem mais profissional da análise técnica.

Os mercados financeiros têm sido objeto de pesquisas acadêmicas desde pelo menos 1900, quando Louis Bachelier publicou sua tese de doutorado (PhD dissertation) “Théorie de la speculation”, que discutiu o uso do movimento browniano para modelar os preços no mercado financeiro. Um estudo da teoria Dow foi realizado por Alfred Cowles em 1934. Cowles descobriu que a estratégia de seguir a tendência (trend-following strategy) teria ganho menos do que uma estratégia de compra e retenção (buy-and-hold strategy). Em contraste, uma revisão mais recente desse trabalho (Brown, Goetzmann e Kumar) concluiu que a carteira da teoria Dow produziu maiores retornos ajustados ao risco. Quando o risco é considerado, Brown, Goetzmann e Kumar (1998) concluíram que uma carteira seguindo os editoriais da teoria Dow teria tido uma razão Sharpe maior do que uma carteira buy and hold (0,559 em comparação com 0,456) e uma medida de Jensen positiva de 4,04%.

Outras áreas da análise técnica também foram submetidas a rigorosos estudos, muitas vezes com resultados mistos. No artigo “Simple Technical Trading Rules and the Stochastic Properties of Stock Returns”, Journal of Finance (1992), Brock, Lakonishok e LeBaron encontraram que as médias móveis eram eficazes. Este artigo testou duas das regras de negociação mais simples e mais populares – média móvel e quebra de intervalo de negociação (trading range break), utilizando uma série de dados muito longa, o índice Dow Jones de 1897 a 1986. A análise estatística padrão é estendida através do uso de técnicas bootstrap. Em geral, os resultados forneceram um forte apoio às estratégias técnicas que foram exploradas. Os retornos obtidos dos sinais de compra (venda) não são consistentes com os três modelos nulos populares: o passeio aleatório (random walk), o AR(I) (Autoregressive) e o GARCH-M (Generalized Autoregressive Conditional Heteroscedasticity in Mean). Consistentemente, sinais de compra geram retornos mais elevados do que sinais de venda. Além disso, os retornos a seguir aos sinais de venda são negativos, o que não é facilmente explicado por nenhum dos modelos de equilíbrio atualmente existentes. Adicionalmente, os retornos após os sinais de compra são menos voláteis do que os retornos após os sinais de venda. Os resultados geralmente mostraram que os retornos durante os períodos de compra são maiores e menos voláteis do que os retornos durante os períodos de venda. Por exemplo, a média móvel de comprimento variável produziu em média um retorno diário para os períodos de compra de 0,042%, que é de cerca de 12% a uma taxa anual. O retorno diário correspondente para os períodos de venda foi de -0,025%, que é cerca de -7% a uma taxa anual.

Embora este estudo apoie a ideia de que a análise técnica funciona, o estudo pode ser questionado pelo viés de mineração de dados (data mining bias). Mesmo que apenas duas regras tenham sido testadas, inúmeros parâmetros e filtros foram testados para encontrar os valores que forneceram os melhores resultados. No total, foram estudadas 7.846 regras técnicas de negociação diferentes.

Sullivan, Timmermann e White, “Data-Snooping, Technical Trading Rule Performance, and the Bootstrap”, Journal of Finance (1999), analisaram este estudo para avaliar se a mineração de dados apresentava problemas. Eles concluíram que o processo utilizado não apresentou problema, mas eles observaram: “é possível que, historicamente, a melhor regra técnica tenha realmente produzido um desempenho superior, mas mais recentemente ‘os mercados se tornaram mais eficientes’* e, portanto, essas oportunidades desapareceriam”.

Um estudo subsequente de Fang, Jacobsen e Qin, “Predictability of the Simple Technical Trading Rules: An Out-of-Sample Test”, Review of Financial Economics (2014), parece confirmar que as regras de média móvel simples podem deixar de ser eficazes com base em um teste de amostras que ficaram de fora” (out-of-sample test). Em um teste de amostras que ficaram de fora não foi encontrada nenhuma evidência de que várias estratégias técnicas de negociação bem conhecidas previram o mercado de ações durante o período de 1987 a 2011. O teste está livre* do viés de seleção de amostra, do viés de mineração de dados, do viés de retrospectiva ou qualquer um dos outros vieses habituais que podem afetar os resultados do estudo. Foram utilizadas exatamente as mesmas regras técnicas de negociação que Brock, Lakonishok e LeBaron (1992) mostraram funcionar melhor em sua amostra histórica. Uma análise mais aprofundada mostra que este mau desempenho fora da amostra provavelmente não se deve ao fato de o mercado se tornar mais eficiente – instantaneamente ou gradualmente ao longo do tempo –, mas provavelmente devido ao viés.

Outros pesquisadores têm explorado técnicas mais sofisticadas. Conrad e Kaul no artigo “An Anatomy of Trading Strategies”, Review of Financial Studies (1998), utilizaram uma única estrutura unificadora para analisar as fontes de lucros para um amplo espectro de estratégias de negociação baseadas em retorno implementadas na literatura. Foi mostrado que menos de 50% das 120 estratégias implementadas no artigo geram lucros estatisticamente significativos e, incondicionalmente, estratégias momentum e contrárias são igualmente prováveis ​​de serem bem-sucedidas. No entanto, quando foi condicionado o horizonte de retorno da estratégia (curto, médio ou longo), ou o período de tempo durante o qual ela é implementada, surgem dois padrões. Uma estratégia momentum é normalmente rentável no horizonte médio (2-12 meses), enquanto na estratégia contrária foram gerados lucros estatisticamente significativos a longo prazo, mas somente durante o subperíodo 1926-1947. Mais importante ainda, os resultados mostram que a variação transversal dos retornos médios dos títulos individuais incluídos nessas estratégias desempenha um papel importante na sua rentabilidade. A variação transversal pode, potencialmente, explicar a rentabilidade das estratégias de momentum e também é responsável por atenuar os lucros das inversões de preços para estratégias contrárias de longo prazo.

Ao introduzir o conceito do horizonte de retorno ao seu estudo, Conrad e Raul reconhecem que os traders técnicos não são um grupo homogêneo. Esta observação tem implicações práticas importantes para os traders. As suas conclusões podem ser reafirmadas da seguinte forma: tendências e estratégias momentum têm maior probabilidade de gerar ganhos para os traders a longo prazo, enquanto os traders de curto prazo têm maior probabilidade de obter sucesso com as estratégias de reversão média. Na prática, a importância do horizonte temporal explica, pelo menos em parte, a popularidade dos osciladores (indicadores técnicos populares, como RSI e estocástico) entre os traders de curto prazo e o uso de médias móveis (uma ferramenta de tendências) e estratégias de força relativa entre os traders com um horizonte de tempo mais longo.

Como os estudos continuam a ser publicados, o número de resultados conflitantes parece crescer. Uma revisão realizada por Park e Irwin no artigo “The Profitability of Technical Analysis: A Review”, 2004, resumiu os resultados de uma série de outros estudos:

O número de estudos que identificaram estratégias rentáveis ​​de negociação utilizando análise técnica é muito maior do que o número de estudos que encontraram resultados negativos. Entre um total de 92 estudos modernos, 58 estudos encontraram rentabilidade (ou previsibilidade) em estratégias de negociação técnica, enquanto 24 estudos relataram resultados negativos. O restante (10 estudos) indicou resultados mistos. Em cada mercado, o número de estudos rentáveis ​​é o dobro do de estudos não rentáveis. No entanto, estudos modernos também indicaram que as estratégias técnicas de negociação tinham sido capazes de gerar lucros econômicos nos mercados de ações dos Estados Unidos até o final da década de 1980, mas não posteriormente (Bessembinder e Chan, 1998; Sullivan, Timmermann e White, 1999). Vários estudos encontraram lucros econômicos em mercados emergentes (ações), independentemente dos períodos de amostragem considerados (Bessembinder e Chan; 1995, Ito, 1999; Ratner e Leal, 1999). Para os mercados de câmbio, parece evidente que as estratégias técnicas de negociação fizeram lucros econômicos nas últimas décadas, embora alguns estudos sugerissem que os lucros de negociação técnicas diminuíram ou desapareceram nos últimos anos (Marsh, 2000, Neely e Weller 2001 e Olson, 2004). Para os mercados de futuros, as estratégias técnicas de negociação pareciam rentáveis ​​entre meados dos anos 70 e meados dos anos 80. Nenhum estudo ainda documentou detalhadamente a rentabilidade das estratégias técnicas de negociação nos mercados de futuros após esse período.

É provável que alguns profissionais concordem com a conclusão de que as regras técnicas simples de negociação geralmente não resultam em lucros. Por esta razão, os praticantes da análise técnica geralmente aplicam técnicas múltiplas ao invés de regras simples que são amplamente estudadas. Assim, seus resultados podem diferir dos resultados vistos nos estudos. Os analistas técnicos frequentemente, por exemplo, combinam força relativa (RS) ou momentum com métodos de valor (valuation) em um modelo de fusão de análises (fusion analysis). Limitar o universo de possíveis investimentos para valorizar ações é um passo para limitar o risco sob este modelo.




* Alguns trechos do artigo não representam necessariamente a opinião do blog https://gestaofinanceirapersonalizada.blogspot.com.br

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